Friday, March 07, 2008

A ousadia dos pequenos

By Luciano “Carioca” Vitor

Já são seis anos de labuta e esforços hercúleos que culminaram em cinco livros lançados, de dois autores, mas resumindo assim parece que é mais uma dessas idéias de fundo de quintal que culmina numa micro-editora e a idéia se torna apenas palavras dentro de um currículo.

Um dos autores lançados pela Spectro Editora é o grande autor americano Charles Bukowski, criador de tipos memoráveis como Hank Chinaski (seu alter ego) e líder (mesmo que sem pedir) de uma geração inteira de loucos, bêbados, aspirantes a escritores (alguns até que conseguiram seus intentos, basta ver a gaúcha Clara Averbuck que bebe descaradamente na fonte de Bukowski, só que com uma outra roupagem) e músicos, na maioria roqueiros, que o idolatram. Desde o projeto paralelo da Comunidade Nin Jitsu, a 808Sex até bandas como o U2, cujo vocalista Bono Vox é fã declarado do autor. Ele escreveu uma canção homenageando o autor, “Dirty World”, que utiliza palavras de um livro de poesias chamado “The Days Run Away Like Wild Horses Over the Hills”, o que no mínimo é um contra-senso enorme, já que Bukowski não gostava de rock e nem de roqueiros, sua paixão era a música clássica. Mas como começou essa historia? Uma pequena editora capitaneada por três amigos consegue lançar 4 livros de poemas de Bukowski no Brasil desbancando grandes editoras e impérios literários.

Que o sul do país tem uma extensa vocação para empreendimentos editoriais, qualquer um mais informado sabe, mas em Florianópolis uma editora conseguir publicar o grande autor amado por gerações, no mínimo é estranho. Foi sobre esse desafio de colocar o bloco (ou a editora) na rua e as negociações com os representantes de Bukowski (a Black Sparrow Press que também representa outro ícone e ídolo de Buk, Jonh Fante) que a Dynamite foi conversar em um domingo de chuva, bebendo uma cerveja, com Fábio Soares um dos donos da editora. Porque para entender todo o universo que cerca essa historia é necessário entrar de copo e alma.

Dynamite: Como tudo isso começou? Nos conte mais da historia da Spectro Editora.

Fábio Soares: Bem, eu conheci esse cara de nome misterioso, Aleph Ozuas, em 1997 que logo se tornou um parceiro de bebida e junto me ajudava a editar uma revista de estudantes chamada Poité. Antes disso eu já havia editado por 3 anos um jornal de jogos chamado Avalon, então já estava definitivamente inoculado pelo vício de publicar, a tensão de passar meses virando noites trabalhando em algo muito abstrato na tela do computador e um dia ir na gráfica e ver lá aquele volume materializado. Vicia na hora. Então em 98 decidimos que montaríamos uma editora para lançar uma mistura de novos autores com autores consagrados e deixamos a idéia adormecida num canto. Quando em 2001 entrei em contato com a Black Sparrow Press e resolvi montar a editora, Aleph não estava mais disponível para o projeto, pois nesse meio tempo se aperfeiçoara como webdesigner e montara o excelente site ciberarte.com.br. Então eu e mais dois sócios, um dos quais eu conhecera no jornal de jogos vários anos antes, montamos a editora, que conta ainda com a colaboração esporádica de Aleph, que é quem tirou a foto da ave morta que está na capa de Vida Desalmada.

(O texto completo desta matéria você pode ler na versão impressa da Revista Dynamite.)

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Tuesday, February 05, 2008

à toa em San Pedro

Sobre o Livro

À toa em San Pedro é o quarto volume de poemas de Charles Bukowski publicado pela Spectro Editora, fechando a tetralogia que compõe, no conjunto, a obra Open All Night.

Serve como um fecho pessimista, digno dos finais abruptos de seus poemas. Pessimismo que nunca o abandonou, mesmo quando já cercado de fortuna, às vezes disparando rajadas raivosas, com em onde enfiar, quando diz, “não me culpe pelo mundo fervilhando de assassinos./ não me culpe se você é um deles./ culpe seu pai./ culpe a igreja da esquina”, ou ironizando em Chinaski, “ele está em um pequeno quarto de novo, / sempre em um pequeno quarto, fechando a porta, / trancando o mundo / do lado de fora.”

Pessimismo e ironia que estão na aranha esmagada em problemas na noite, no médico que reclama da paciente que não morre em meu médico, ou na massacrante rotina dos prédios cheios de gente em telefones.

A capa conta com arte especialmente desenhada por Frank Maia e a ilustração interna segue o padrão dos livros anteriores com o tracional cinzeiro-com-copo feito por Rodrigo Véras.

A tradução, a exemplo dos livros anteriores, procurou primar pela exatidão dos termos, procurando sempre correlatos no português para os termos de gíria do inglês. Evitou-se recorrer à notas de rodapé, embora em dois casos tenham sido necessárias. Procurou-se manter a coloquialidade e a oralidade.

Assim como as edições anteriores da Spectro, cada exemplar é numerado, o que o torna único.

Além deste livro a Spectro Editora publicou ainda Hino da Tormenta (Charles Bukowski, 2003), Dia de morrer aos poucos (Sigval Schaitel, 2004), Tempo de vôo para lugar algum (Charles Bukowski, 2004) e Vida Desalmada (Charles Bukowski, 2006). Pode-se entrar em contato com a editora pelo site www.spectroeditora.com.br

Sobre o Autor

Charles Bukowski (1920-1994) é um dos poetas mais influentes da atualidade. Com mais de 60 livros publicados, e a maior parte de sua obra ainda inédita sendo lançada postumamente, Bukowski retrata o mundo com pessimismo e coloquialidade.

Embora sua fama no exterior seja como poeta, sua poesia é ainda muito pouco conhecida e difundida no Brasil, onde a maior parte do que chegou foi a prosa. Seu verso é de estilo simples, o que no entanto não quer dizer desleixado. Pode-se notar em toda sua obra essa busca pela linguagem falada como um elemento importante na forma como Bukowski constrói cenas nítidas e vívidas. Ele é, acima de tudo, um contador de casos, e as linhas curtas e quebradas da poesia lhe fornecem o meio ideal para a concisão de suas histórias, o que aumenta ainda mais seu poder narrativo.

Bukowski foi sim contemporâneo da poesia Beat e se beneficiou em muito dela para a divulgação dos seus poemas, mas no conjunto da obra há um projeto narrativo diferente em Bukowski. Ele próprio sinaliza essa diferença algumas vezes, como no poema O que precisamos, do livro Tempo de vôo para lugar algum, onde o alvoroço do poeta beatnik contrasta com o agradável silencio da geladeira. Essa ironia sutil e fria, que prefere a solidão ao convívio com outras pessoas é marca recorrente na poesia de Bukowski e aparece de modo ainda mais pessimista no à toa em San Pedro. Bukowski é um outsider, alguém que não faz parte da sociedade porque se recusa a se integrar na sociedade, um estrangeiro onde quer que esteja.

É sob esse olhar de alguém que não pertence àquela sociedade, que Bukowski irá contar seus casos e expor sua preferência pelos que vivem à margem na sociedade. Seus poemas vão do melancólico e contemplativo a histórias de bares, bêbados, mulheres e fracassados, passando pelo beisebol, corridas de cavalos, fortuna e tanstornos cotidianos, como no poema problemas na fila do caixa, incluso no à toa em San Pedro, onde ele conclui: “o quer precisamos é o que queremos e / o que queremos / tem muito pouco a ver / com qualquer outra / coisa”.

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Saturday, April 01, 2006

Vida Desalmada

Mais um livro do velho safado: Charles Bukowski (1920-1994) é um dos poetas mais influentes da atualidade. Com mais de 60 livros publicados, e a maior parte de sua obra ainda inédita sendo lançada postumamente, Bukowski retrata o mundo com pessimismo e coloquialidade. Este livro, o terceiro volume publicado pela Spectro Editora, traz poemas da fase tardia da vida do autor, lidando com os problemas da fama, da viagem para a Europa, cartas de leitores e monogamia. Seu mundo continua, no entanto, perturbado e estrangulado por mecanismos além de sua compreensão, como no poema fechaduras, ou pelo convívio com outras pessoas, como no trecho abaixo do poema bons tempos:

fiquei cansado de ir aos bares
e depois fiquei cansado até de
dirigir até a loja de bebidas,
comecei a encomendar por
telefone.
eles me conheciam.
alguns tinham lido meus livros.
podia ouvi-los falando
no fundo
através do telefone.
estavam discutindo sobre
quem iria
entregar o pedido.
todos queriam entregar,
eles queriam ver o
circo de horrores:
eu na porta
com cabelo na cara,
minha barriga de cerveja sob a camiseta,
meus olhos vermelhos,
minha barba por fazer,
as garrafas no chão,
as mulheres.
eles queriam ver
isso.

Sunday, March 12, 2006

Datapimp


Que tal um e-mail seunome@leavemethefuckalone.com ou seunome@leavemethefuckalone.com, ou ainda seunome@fuckinginternet.com. Você pode ter isso de graça, ou ainda criar um endereço de redirecionamento para o seu site, algo como www.seusite.fuckinginternet.com, na datapimp, the anti-host. Além disso as meninas do datapimp oferecem também serviços de um host normal, como hospedagem de sites e seus penduricalhos...

Bukowski.Net

O site Bukowski.Net é o maior banco e dados sobre Charles Bukowski que já encontrei na Internet. Lá você encontra desde as cartas enviadas pelo escritor, passando pelos seus desenhos, pinturas e fotografias, até os arquivos do FBI, que investigou a vida de Bukowski apartir de 1968.

A logo da Spectro

Para quem não sabia, a logomarca da spectro editora foi inspirada nos fantasmas do jogo Pac-Man, da Atari. E por acaso você lembra o nome deles? Os personagens são Inky, Blinky, Pinky, e Clyde. Qual deles você acha que é o fantasma da Spectro?

Sunday, August 29, 2004

A difícil tarefa de traduzir os poemas de Bukowski

Editora de SC converte textos para a língua portuguesa

Bukowski com a amiga Georgia, numa foto famosaFlorianópolis — Em seu trabalho, Fábio Soares precisa aprender novos palavrões em outras línguas. Pelo menos foi assim que o tradutor e editor conseguiu passar para o português parte da obra do escritor e poeta Charles Bukowski com o máximo de fidelidade possível.

Junto aos tradutores Sigval Schaitel e Gerciana Espíndola, Fábio converteu para o vocabulário tupiniquim “Hino da Tormenta”, em agosto de 2003, e “Tempo de Vôo para Lugar Nenhum”, lançado em maio deste ano, pela editora Spectro.

Outras duas publicações traduzidas dos poemas de Bukowski devem ser feitas pela empresa. As quatro obras formam o livro “Open all Night”, lançado nos Estados Unidos em 2003. “Escolhemos esse, até porque era o último. Mas não iria dar certo um livrão de 400 páginas de poesia aqui no Brasil”, diz, explicando porque a obra foi dividida.

ÚNICAS

Além de Jorge Wanderley, que lançou “Os 25 Melhores Poemas de Charles Bukowski” (editora Bertrand Brasil) no ano passado, as duas publicações da Spectro são as únicas no País com poemas do autor alemão, radicado nos EUA.

Isso porque, no Brasil, a prosa de Bukowski faz parte de sua obras mais conhecidas. “Até pra corrigir isso que a gente foi atrás dos poemas. É na poesia que se vê seu melhor estilo. Lá fora (exterior), a prosa dele é rejeitada. Ele ganhou a vida recitando poemas em universidades.”

GÍRIAS

As traduções, segundo Fábio Soares, levam, em média três meses. Nas duas que fez, as dificuldades foram as gírias e os palavrões utilizados pelo “velho safado”. Para isso, ele se valeu de um dicionário de gírias, mas, muitas vezes, teve que colocar a cabeça para funcionar. “Tem que ficar muito atento porque algumas coisas não estão dicionarizadas. Daí tem que entender qual contexto”, fala.

Soares cita como exemplo a expressão bild like a shit house, que literalmente seria traduzido “construída como uma casa de merda”. No entanto, Bukowski falava de uma mulher bonita. A versão final ficou como “gostosona e tão cheia de curvas quanto um mictório” — geralmente mal construído ou feito de forma encurvada. “Tem de explicar a metáfora”, diz.

Outro ponto de atenção na tradução são os termos esportivos para duas atividades constantemente exploradas por Bukowski: o beisebol e a corrida de cavalos. Nesse caso, não basta a tradução literal, mas o uso que as palavras têm no Brasil. “Chegamos a ligar para um hipódromo”, relembra aos risos. A jogada homer ou home run, por exemplo, é comum aos adeptos do beisebol, mas — como o esporte não é popularizado no Brasil — foi traduzida como “rebater uma para fora”.


“Namoro” com a obra do escritor é coisa antiga

Gerciana Espíndola e Fábio Soares com os livros de poesias traduzidos para a Spectro EditoraPublicar as obras do autor é um namoro antigo. Durou dois anos de negociação com a editora Black Sparrow Press, dos Estados Unidos, responsável pela obra, e com o escritório de representação International Editors, no Brasil. Quando a editora foi vendida à Harper Collins, o começo da tradução ficou mais lento. O processo de “aportuguesar” a poesia do Bukowski iniciou-se com cada um dos tradutores — Soares, Sigval e Gerciana — lendo um trecho do livro e passando para o português simultaneamente. Depois de anotadas as dúvidas, recorreu-se a dicionário, pesquisa e debate sobre as partes inentendidas. “Um dicionário bom dá o contexto da palavra: se é preconceituosa ou ofensiva, mas infantil, por exemplo”, justifica Soares.

Para traduzir o autor, os três tiveram de ler diversas obras em português e inglês para conservar o estilo. “Tem um fluxo narrativo fantástico; (ele) faz as palavras correrem soltas e consegue-se fazer retratos muito bons”; exalta. Nessa parte, diz, contou muito a dedicação de Sigval à poesia, que já lançou obra pela Spectro. “Ele tem umestilo parecido com o do Bukowski”. A outra tradutora, Gerciana, também tinha bom contato com a obra do escritor alemão. Fez sua monografia para formatura no curso de letras (língua inglesa) sobre os erros da tradução de Bukowski por Jorge Wanderley, no livro lançada pela Bertrand Brasil em 2003.

O próximo desafio, conta Soares, será a tradução de contos de Dan Fante, filho de John Fante. A editora planeja lançar o trabalho do autor juntamente com produções de contistas brasileiros “nem tão famosos”, em dezembro.


Originalmente publicado em:
A notícia – Santa Catarina - Anexo - Página C3
Domingo, 29/8/2004

Sunday, August 15, 2004

Revista Outracoisa – música e comportamento

Capa de Tempo de vôo para lugar algumTempo de vôo para lugar algum
Charles Bukowski
Spectro Editora

Mulheres, bêbados, heróis vagabundos e tudo mais com a cara do velho Buk estão nessa coletânea. São 104 páginas com 51 poemas irresistíveis. No meio do humor cínico e das letras apaixonantes e dedicadas, encontramos um desabafo: “Poetas demais? Poemas / demais? Não! Não há o / suficiente! Precisamos de mais poetas, / mais poemas! Temos que encher / as ruas do mundo com / nossos poemas!” Essa invasão de versos pode começar com o “Tempo de vôo para lugar algum”, da Spectro Editora. (R.M.)

Publicado em: Revista Outracoisa – música e comportamento
Ano II – No 8/04 - Agosto/2004 - Página 59

Tuesday, August 03, 2004

À procura de espaço

Dois dos editores da Spectro, Paulo de Tarso e Fabio Soares, durante lançamentoAinda que editoras surjam a toda hora, o mercado livreiro nacional tem problemas ancestrais, que inibem o aparecimento de novos selos. Volta e meia, porém, alguém tenta romper o bloqueio de gente estabelecida e apresenta lançamentos interessantes. A Spectro, sediada em Florianópolis, é um destes casos. Apesar de recente, possui já, em seu primeiro ano de vida, três títulos no catálogo. Pelo menos dois deles - Hino da Tormenta e Tempo de Vôo Para Lugar Algum, poemas de Charles Bukowski - têm força para interessar leitores de todos os quadrantes, em razão da estatura de seu autor, o norte-americano de origem alemã que escreveu Crônica de um Amor Louco. O terceiro volume é Dia de Morrer aos Poucos, de Sigval Schaitel, um conjunto de poesias de um dos tradutores de Bukowski - os demais tradutores do “Velho Safado” são Fabio Soares e Gerciana Spíndola, dupla que, ao lado de Paulo de Tarso, completa o time dos sócios da Spectro.

Dia de Morrer aos Poucos, de Sigval SchaitelOs principais obstáculos dos selos emergentes são, desde sempre, a propaganda e a distribuição, conforme reconhece Soares. Há uma espécie de círculo vicioso que barra a publicidade em jornais e revistas, por sua vez responsável pela dificuldade em levar o produto até o consumidor, nas livrarias. “Mas o nosso projeto, até o quarto livro, não é o retorno”, diz ele. No caso de Hino da Tormenta e Tempo de Vôo Para Lugar Algum, nem mesmo a qualidade dos poemas tem ajudado a escoar os livros. Em Porto Alegre, por exemplo, apenas a Livraria Cultura do Bourbon Shopping Country, as Livrarias Porto do Shopping Iguatemi - ambas filiais de redes maiores, que têm a preocupação de registrar tudo o que se publica no País - e a Via Sapiens, na Lima e Silva, os mantêm em estoque. O panorama não é diferente no restante do território nacional, sendo, às vezes, até pior.

A saída, em tempos de Internet, tem sido a venda direta pelo correio, o que ameniza um pouco do investimento de Soares, Tarso e Gerciana. "Metade das vendas se dá por e-mail, indicação, citação em blogs ou pelo nosso site, www.spectroeditora.com.br. Temos distribuição só no Sul e em São Paulo", conta o editor e tradutor, que pretende colocar no mercado outro Bukowski na metade de 2005, se houver dinheiro em caixa para financiar a impressão. Antes, deverá sair, até o final do ano, uma antologia de contos de autores brasileiros, que incluirá uma história de Dan Fante - filho de John Fante, escritor norte-americano que assinou Pergunte ao Pá e Espere a Primavera, Bandini e o preferido de Bukowski.


Escrito por: Eduardo Lanius
Originalmente publicado em:
Panorama – Jornal do Comércio - Página 1 - Capa
Terça-feira, 3 agosto de 2004 – No 40 – Ano 72

Sunday, August 01, 2004

Revista MOSH

Capa de Tempo de vôo para lugar algumTempo de vôo para lugar algum
Charles Bukowski
Spectro Editora

Herói dos bêbados e vagabundos cultos, Charles Bukowski se notabilizou por glorificar a marginália, em que bares e quartos imundos de hotéis baratos eram cenários perfeitos para histórias de desesperança. Por causa disso, e por conta de um estilo ricamente impiedoso em retratar as desgraças alheias, o escritor acabou se tomando uma das personalidades literárias mais influentes de todos os tempos.

Dez anos depois de sua morte, Bukowski volta a ser assunto com o lançamento de Tempo de Vôo Para Lugar Algum, livro póstumo de poemas que serve de excelente introdução para uma área relativamente desconhecida de sua carreira.

Evidentemente, o humor cínico e corrosivo de Bukowski se mostra presente ao abordar relacionamentos, casamentos e a cretinização do cotidiano, nos quais o fracasso é onipresente. Talvez a obra menos identificada com a corrente beat, Tempo de Vôo... é boa pedida para quem não acredita na felicidade gratuita. (RT)


Publicado em: Revista MOSH – atitude, informação e muita música!
Número 1 – Agosto/2004 – Página 66

Tuesday, July 27, 2004

Ternura e reflexão

Capa do Hino da TormentaHino da Tormenta (2003, 94 páginas, R$ 18,00) e Tempo de Vôo Para Lugar Algum (2004, 104 páginas, R$ 20,00), de Charles Bukowski, ambos da iniciante editora catarinense Spectro e em tradução do trio Sigval Schaitel, Gerciana Espíndola e Fabio Soares, desvelam um tanto do que Hank (seu apelido) fez em poesia. Do autor de Cartas na Rua, Mulheres e Misto Quente, romancista de mão cheia, os versos só estavam disponíveis em português em trechos da biografia Charles Bukowski - Vida e Loucuras de um Velho Safado (Conrad), de Howard Sounes, e em Os 25 Melhores Poemas de Charles Bukowski (Bertrand), seleção cujo pretensioso título descumpria o prometido. Enquanto não chegam ao português antologias definitivas e panorâmicas, os dois volumes - na verdade, desdobramento de um único, o póstumo Open All Night: New Poems (2000), que os editores decidiram dividir - suprem a lacuna com folga. Hino da Tormenta (Hymn from the Hurrycane, primeira parte do volume norte-americano) e Tempo de Vôo Para Lugar Algum (Flight Time to Nowhere, segunda parte) são puro Bukowski e poesia de qualidade incomum. E de se perguntar, aliás, o porquê de o autor ter permanecido praticamente inédito no gênero por aqui.

Hino da Tormenta apresenta retratos admiráveis da vida cotidiana, carregados de ternura e não raro doloridos de tanta delicadeza. Bukowski tem ímpeto de cronista, fixa uma situação com parcos recursos e deixa de lado metáforas lapidadas ou palavras singulares. Como lírico melancólico que é, olha para o passado despido de adornos, com uma visada reflexiva que a distância provavelmente exacerbou. Em Um lugar para ficar, por exemplo, é difícil não se comover: “ser jovem, idiota, pobre e feio/ não contribui para fazer a vida parecer melhor./ tantos fins de tarde, examinando as paredes sozinho/ sem/ nada pra fumar/ nada pra comer/ (nós geralmente bebíamos rápido o meu salário)/ ela sempre parecia ansiosa pra ir embora/ ansiosa pra se mudar/ mas primeiro ela ame fez passar/pela sua escola/ (me dando Mestrado e Doutorado/ no assunto)/ e ela sempre voltava no final,/ ela queria um lugar para ficar,/ ela dizia,/ algum lugar pra deixar suas roupas./ dizia que eu era engraçado,/ que eu fazia ela rir/ mas eu não estava tentando ser/ engraçado./ ela tinha pernas bonitas e era/ inteligente mas não se importava/ com nada,/ e toda minha fúria e meu humor e/ toda minha loucura apenas a entretinham/ brandamente: eu estava atuando pra ela/ como uma marionete triste em alguma farsa de mim mesmo./ algumas poucas vezes depois que ela saía eu tinha/ vinho vagabundo e cigarros na mãos suficientes/ para uns poucos dias,/ eu ouvia o rádio e olhando para as/ paredes e ficava bêbado o suficiente para/ quase esquecê-la/ mas então ela vol tava mais uma/ vez.” Para além da beleza do quadro doméstico, há um cuidado especial com o andamento cadenciado da construção. O que tem aparência de gratuidade descompromissada nem sempre é assim, e o escritor está muito consciente do efeito que pretende causar.


A linguagem universal da empatia

Capa do Hino da TormentaTempo de Vôo Para Lugar Algum é ainda melhor. Fora de cena o personagem beberrão e rabugento dos romances, folclórico e humano em sua patetice, entra no palco o artífice de sagas individuais quase elegíacas. A comicidade, a falta de heroísmo e o instante significativo que a memória preservou estão lá, intocados e recriados para a posteridade. Se Bukowski incomodava, quando afrontava um american way of life incompreensível com sua vagabundagem ostensiva e seu desapego aos bens materiais, nos dois conjuntos de poemas em questão ele se impõe por força de um poderio mais incisivo. Sem medo de se expor em intimidade, o criador do alter ego Henry Chinaski revela pendor para uma sinceridade que, nas narrativas, tinha muito de impostura juvenil. E em certos poemas de amor que ele soa imbatível, como em Sim, estou: “(...) gosto de ler o jornal de domingo na cama com ela./ gosto de fitas laranja amarradas no pescoço do gato./ gosto de dormir de encontro a um corpo que conheço bem./ gosto dos chinelos pretos jogados ao pé da cama às/ duas da tarde./ gosto de ver como saíram as fotos.// gosto de ser socorrido nos feriados:/ dia da independência, dia do trabalho, dia das bruxas, ação de graças,/ natal, ano novo./ as mulheres sabem como navegar na tormenta/ e elas têm menos medo do amor que eu.// minhas mulheres me fazem rir quando comediantes profissionais/ falham.// tem aquele bem-estar de sair juntos para/ comprar o jornal.// me agrada muito estar sozinho/ mas há também um estranho e afetuoso encanto em não estar sozinho.// gosto de dividir batatas cozidas tarde da noite/ gosto de olhos e dedos mais hábeis que os meu que podem/ desatar do nós do cordão dos meus sapatos.” Em seus poemas-crônicas, Bukowski se redime da eventual sordidez (que há) e fala a linguagem universal da empatia.

Escrito por: Eduardo Lanius
Originalmente publicado em:
Panorama – Jornal do Comércio - Página 1 - Capa
Terça-feira, 27 de julho de 2004 – No 36 – Ano 72

Saturday, April 10, 2004

Poesia sem gelo

Capa de Hino da TormentaHino da Tormenta, de Charles Bukowski
Spectro Editora, 96 págs.

E lá está o velho. Sua literatura masculina, bêbada e seu estilo inconfundível de chutar o balde da tolice. Para matar a fome dos fãs de Charles Bukowski, cuja poesia é tão pouco traduzida por aqui, Hino da Tormenta é a primeira parte da tradução de Open All Night: New Poems. 0 segundo dos quatro livros já está pronto. Obrigada a quem decidiu fazer o trabalho sujo: bela tradução, edição pulp estilo Black Sparrow Press, preço camarada — e ainda sobra um troco pra tomar uma dose enquanto se lê.

Fernanda D'Umbra, atriz; seu blog é o www.semgelo.blogger.com.br

Publicado em: Revista TRIP
Ano 17 – Abril 2004 – No 121
Página 60

Thursday, September 18, 2003

Poemas de Bukowski ganha edição na Capital

Ilustração de contracapa de Hino da Tormenta, por Frank MaiaFlorianópolis — Charles Bukowski (1920-1994) escreveu a maior parte de suas obras sobre mulheres, bêbados, heróis vagabundos vivendo em pequenos quartos de hotel e perdendo seu dinheiro apostando em cavalos. Passados nove anos da morte do outsider chega ao mercado nova edição de “Hino da Tormenta” (Spectro Editora), livro que terá tarde autógrafos hoje, no Centro de Comunicação e Expressão (CCE) na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

O volume é o primeiro de uma série de quatro livros de poemas de Bukowski que serão lançados ainda neste segundo semestre de 2003. Com capa ilustrada com um quadro de André Zomp Zannetto, contracapa com uma caricatura de Bukowski feita por Frank Maia, chargista de A Notícia, e arte interna assinada por Rodrigo Véras, esse trabalho do autor não foge ao seus estilo, ácido e recheado de referência a sexo e bebedeiras. Quanto à narrativa, o livro é marcado pela morte de Jane Cooney Baker, uma das mulheres que ele mais admirava e que literalmente bebeu até morrer.

PAIXÃO

Mais do que mostrar o cenário bukowskiniano do sonho americano jogado no lixo, este livro deixa entrever um poeta dedicado, que escrevia com paixão e dedicação diariamente, ao ponto que depois de mais de 50 livros publicados, a maior parte de sua obra continua inédita. Em alguns poemas deste livro podemos ver que, por baixo da superfície decadente de seus personagens, se esconde um projeto poético ambicioso.

A Spectro Editora, de Florianópolis, faz com isso o lançamento de seu primeiro livro, tendo já programado o lançamento mensal de outros livros de autores locais e estrangeiros.

OUTRO LANÇAMENTO

Capa de Cartilha de Jack & JanisTambém hoje, no mesmo local, a editora lança “Cartilha de Jack & Janis”, romance de Egídio Mariano do Nascimento que satiriza a vida conjugal moderna. A narrativa se desenvolve em torno da tensão entre a emblemática postura de Janis, a heroína, e o sorumbático olhar de Jack, o anti-herói. O casal está ligado por um destino tão surpreendente quanto irreal, pois quem nos conta a história, o Narrador, a transforma ao se intrometer na vida conjugal de Jack & Jani.

Ao longo da narrativa, o romance revela questões cotidianas de relacionamentos conjugais atuais ao levar Jack & Janis a uma longa e quixotesca jornada. O autor nasceu em Florianópolis, em 1976. É estudante de letras na UFSC, já publicou alguns contos em revistas, e este é seu primeiro livro publicado, enquanto outros já escritos aguardam.

• O QUÊ: Lançamento dos livros HINO DA TORMENTA, de Charles Bukowski, e CARTILHA DE JACK & JANIS, de Egidio Mariano do Nascimento. QUANDO: Hoje, 18h. ONDE: Bloco B do Centro de Comunicação e Expressão (CCE) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), campus Trindade, Florianópolis.


Originalmente publicado em:
A notícia – Santa Catarina - Anexo - Página C3
Quinta-feira, 18/09/2003

Wednesday, September 10, 2003

Contracapa do Hino da Tormenta

Bukowski nasceu em Andernach, Alemanha, no ano de 1920, mudando-se aos três anos de idade para os Estados Unidos. Em Los Angeles escreveu a maior parte de sua obra, que trata geralmente de bêbados, putas, corridas de cavalos e, como já foi dito, retrata o “sonho americano jogado no lixo”. Publicou seis romances, dez livros de contos e crônicas, inumeráveis volumes de poemas em vida e mais alguns postumamente, entre eles este que a Spectro Editora traz agora ao público brasileiro sob o título de Hino da Tormenta.